Segundo o advogado trabalhista Rafael Izidoro, incentivos assistenciais desorganizados podem desestimular o retorno de profissionais qualificados ao emprego com carteira assinada
Embora fundamentais para garantir dignidade em contextos de vulnerabilidade, os benefícios sociais oferecidos pelo Estado brasileiro podem gerar efeitos colaterais no mercado de trabalho, especialmente na oferta de mão de obra qualificada. A avaliação é do advogado Rafael Izidoro, especialista em Direito do Trabalho e CEO do Grupo VOI, que já liderou mais de 10 mil processos judiciais na área trabalhista.
“Quando o benefício assistencial se torna mais vantajoso do que a renda líquida de um emprego formal, o trabalhador perde o incentivo para retornar ao mercado”, afirma Izidoro. Segundo ele, esse fenômeno se acentuou nos últimos anos, afetando inclusive profissionais capacitados que optam por permanecer fora da formalidade para não perder o acesso aos programas públicos.
Estudo recente do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (FGV Ibre) mostra que, em 2024, o número de brasileiros fora da força de trabalho, ou seja, que não trabalham nem procuram emprego, chegou a 66,2 milhões, o maior contingente desde o início da série histórica.
Parte desse grupo é composta por pessoas aptas e capacitadas, mas que optam por permanecer afastadas do mercado formal, em função da combinação de benefícios sociais e empregos de baixa remuneração. “O modelo atual, em alguns casos, cria uma armadilha da renda. O trabalhador formalizado perde o acesso a auxílios como Bolsa Família, benefícios emergenciais ou subsídios locais, e passa a receber menos do que receberia informal ou desempregado”, explica Izidoro.
A avaliação do especialista também se ampara na experiência prática à frente do Grupo VOI, que presta consultoria jurídica e atua diretamente na defesa dos direitos de trabalhadores em diversos setores, acompanhando de perto os impactos das relações trabalhistas na vida real das pessoas. “Vemos empresas com vagas abertas e dificuldade em atrair mão de obra com qualificação básica, especialmente em áreas operacionais, porque o candidato faz a conta e percebe que ‘trabalhar custa caro’ diante dos cortes automáticos nos programas sociais”, relata.
Além do impacto direto na decisão individual dos trabalhadores, o descompasso entre os programas assistenciais e a lógica do emprego formal afeta a competitividade das empresas, especialmente as de pequeno e médio porte. Segundo Rafael Izidoro, há regiões em que a rotatividade aumentou justamente por conta da oscilação entre a formalização e o retorno aos benefícios. “Empresas relatam dificuldade em reter funcionários que, após alguns meses, pedem desligamento para não comprometer o acesso a auxílios. Isso desestrutura equipes, eleva custos de contratação e reduz a produtividade”, pontua.
Outro desafio apontado pelo especialista é o estigma que recai sobre a informalidade. Apesar de não contribuir diretamente com a previdência nem gerar os direitos previstos na CLT, muitos trabalhadores optam por ocupações informais que lhes garantem certa autonomia, ganhos imediatos e, sobretudo, a manutenção dos benefícios sociais. “Em vez de demonizar a informalidade, o Estado deveria entender por que ela se tornou, para muitos, a única alternativa viável”, afirma Izidoro.
Ele defende, ainda, a implementação de um sistema de transição gradual que permita ao beneficiário manter parte do auxílio por determinado período após a formalização. Essa proposta, segundo ele, já é adotada em países como Canadá e Reino Unido, onde o retorno ao trabalho é incentivado com bônus e acompanhamento personalizado. “O problema não está na existência dos programas sociais, mas na falta de políticas de ponte. É preciso ajudar a sair da vulnerabilidade sem punir quem decide voltar a contribuir com o mercado”, finaliza o advogado.
Sobre Rafael Izidoro
Rafael Izidoro é advogado com mais de 18 anos de experiência e especialista em Direito do Trabalho. É CEO e sócio-fundador do Grupo VOI — que integra VOI Advogados, VOI Consultoria e VOI Construtora — com atuação em mais de 10 mil processos judiciais em todo o Brasil. É graduado em Direito pela Universidade de Ribeirão Preto (UNAERP) e possui especialização em Direito Tributário pela PUC-Campinas. Também idealizou o projeto VOI Social, que promove ações de cidadania, educação e apoio a comunidades em situação de vulnerabilidade na região de Paulínia (SP).